quinta-feira, julho 19, 2007

Só a ponta do iceberg...

Em 24 horas Jack Bauer é capaz de salvar o mundo, mas o nosso presidente não consegue ir a público para, pelo menos, manifestar alguma consternação com o maior acidente da história da aviação brasileira. Isso para não mencionar que a empresa que administra os aeroportos é estatal, assim como o controle de vôo e, tirando as companhias aéreas, quase tudo que diz respeito a transporte aéreo no país. Se acrescentarmos que este é o segundo acidente gravíssimo em menos de um ano que, ao menos parcialmente, parece ter como responsáveis profissionais subordinados ao governo federal, temos a impressão de estarmos vivendo dentro de uma piada, de humor negro e extremo mau gosto.

O restante do enredo da piada já é conhecido, e o desfecho só tem graça para o grupelho que está tentando se perpetuar no poder: começa-se uma investigação em busca dos responsáveis, que vai se atolar em informações desencontradas, má vontade e incompetência. Depois de meses, quando os ânimos da população e da oposição estiverem esfriados, será encontrado um bode expiatório: o piloto, a Airbus, São Pedro, Baal... E a roleta russa do transporte aéreo no Brasil continuará. Até quando?

Lula e seu séqüito de çábios (será que o dr. Mangabeira Unger já está pensando em uma “ação de longo prazo” para o transporte?) precisam perceber que, no momento, mais importante do que tentar achar culpados para a tragédia passada é tomar providências para que eventos do mesmo tipo não se repitam no futuro (como se precisássemos de mais uma tragédia para lembrar disso...). É inadmissível que o governo não consiga liberar recursos ou organizar uma parceria com a iniciativa privada para investir em obras de infra-estrutura tão urgentes. Tão inadmissível que só é possível encontrar explicação para tanto descaso na mais simples e descarada falta de vontade. Afinal de contas, Lula governa para “o povo”, o que exclui a “elite”, da qual fazem parte os cerca de 15 milhões de brasileiros que utilizam transporte aéreo em um ano. Estes, que relaxem e gozem.

A estupidez brutal que está fazendo o governo perder uma das maiores oportunidades (só para lembrar, crescimento global exuberante, confortável situação externa do país, inflação baixa, alta popularidade do presidente e elevada confiança da população) de sua história para promover reformas que colocariam o país no caminho do desenvolvimento de longo prazo é pequena perto da crueldade que é submeter, por puro desleixo e incompetência, tantos cidadãos a inúmeros transtornos e riscos. A Tailândia entregou no ano passado um aeroporto internacional novíssimo, ao custo de US$ 3 bilhões, com capacidade para 45 milhões de passageiros por ano – mais do que o dobro do tráfego anual de Congonhas. O Brasil não teria a menor dificuldade de levantar, no mercado internacional, a juros baixos e prazos longos, esse montante (o impacto na dívida pública seria irrisório), para ficar em apenas uma das soluções mais simples. De onde se vê, novamente, que o problema passa longe da falta de acesso a recursos.

Outra medida bem-vinda seria a privatização da Infraero e do controle aéreo. O capitalismo pode não conseguir salvar o mundo, mas é terrivelmente eficiente em fiscalizar companhias. Ao contrário do que observamos hoje no estatismo brasileiro, empresas privadas não gozam do benefício da dúvida – haja vista o que aconteceu hoje com os preços das ações da TAM. Na incerteza da culpa e das conseqüências, o mercado puniu os acionistas da empresa com uma perda de 8.6% do capital investido. Se isso for um exagero momentâneo, será corrigido rapidamente. Se não, os acionistas poderão pressionar a direção da empresa para que seu valor seja recuperado. Esse sistema de “enforcement”, ainda que também sujeito à distorções, jamais conseguirá ser igualado pelo nosso sistema judiciário. A observação dos analistas e investidores, se não sempre precisa, é temida e ininterrupta, pelo simples fato de envolver dinheiro muitas vezes conseguido à duras penas.

O colapso do transporte aéreo nacional e suas centenas de vítimas fatais é apenas uma das faces do imobilismo, leniência e descaso de nossos governantes. Desde o dia em que tomou posse na presidência, o PT apenas tem se preocupado em aparelhar a máquina estatal e o partido, aliciar o maior número possível de aliados e tentar garantir a permanência no poder. Teve a sorte de encontrar uma conjuntura econômica rara e absolutamente benigna, que fez com que o país entrasse em uma rota de estabilidade e crescimento razoável sem muitos sacrifícios. A maioria da população, sem acesso à informação e observando uma melhora considerável no padrão de vida, não enxerga a corrosão lenta e constante do estado: o sucesso econômico age como um grande tapete, para baixo do qual é varrida toda a sujeira gerada por nossos políticos.

Assim como eu torci para que a seleção de futebol se arrebentasse na Copa América, para que houvesse a possibilidade de que fosse notada a idiotice que é colocar um amador para ocupar um cargo de importância (você entraria num prédio projetado por um estudante de segundo ano de engenharia civil?), me resta esperar por uma crise econômica de grandes proporções até 2010. A oposição, desagregada e inoperante, não parece capaz de lançar uma alternativa ao lulismo, de forma que só uma deterioração nas condições de vida de grande parte da população pode fazer com que o país mude seu voto e tenha a possibilidade de sair do atual ciclo de mediocridade institucional e operacional. Eu costumo dizer que, se, em 2010, o país estiver crescendo a 5% ao ano, com inflação baixa e continuidade dos programas sociais mais rudimentares, Lula elege dona Marisa como sua sucessora. É evidente que isso carrega uma boa dose de brincadeira, mas neste caso o tal fundo de verdade é simplesmente assustador.

3 comentários:

Felipe disse...

Bom mesmo!
E bota assustador nisso...
Fil

Anônimo disse...

Antes tarde do que nunca.

Parabéns pela clareza nas críticas e, MUITO IMPORTANTE, por apontar possíveis soluções.

Criticar é muito fácil; ao apontar caminhos já passamos ao estágio seguinte. Falta-nos, agora, atingir o estágio mais importante: temos que fazer algo de concreto.

Não podemos salvar a pátria sozinhos, mas temos que usar a nossa capacidade de influência e o nosso cérebro para mobilizar as cabeças pensantes da nossa geração.

Falo muito sério.

Abraços!
Edu Pascale.

The Husband disse...

Boa PJ!! Realmente é assutador, e me impressiono com o seu pensamento "URSO" em relação a crise economica de 2010.